sábado, 8 de janeiro de 2011

Rola pra cá, rola pra lá





Julie aprendeu a rolar... e como gosta mais do lado direito, tenta rolar no berço sempre para esse lado, até bater na grade e parar toda torta. Talvez por isso (ou não), está dormindo a noite toda sem acordar finalmente!!!! Palpite - quando ela acorda à noite, rola para um lado e volta a dormir. Adorei...

Primeiro Natal e Reveillon - acabou dormindo antes do Papai Noel chegar, mas tiramos a foto tradicional na árvore de Natal. E no Reveillon, como vcs viram, recebeu a homenagem emocionante do Papai na São Silvestre...

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

São Silvestre - homenagem do Papai


Precisava registrar em texto para minhas mulheres as emoções vividas na octagésima sexta corrida de São Silvestre. Então vamos lá!


Tudo começou há mais de um ano quando fiquei sabendo que seria pai pela primeira vez. Falei que iria correr com uma camisa com os dizeres: "Sou o papai mais feliz do mundo!". Mas em 2009 tive uma série de lesões, entorse, distensões musculares. Deixei para depois. Então em 2010 resolvi voltar a treinar para homenagear a minha recém formada família, minhas mulheres. Minhas paixões. Foi difícil, as lesões anteriores deixaram cicatrizes, não conseguia treinar para valer. Minha panturrilha esquerda incomodava constantemente. Faltaram fisioterapia e fortalecimento da região, fui prestar atenção em novembro. Já era tarde. Mas meu desempenho cardiovascular era bom e continuei treinando, procurei aumentar os exercícios de musculação para as pernas. Sempre com o pensamento que iria homenageá-las. Precisava fazê-lo, foi um ano de mudança radical para a vida da minha mulher. Nós precisávamos deste último feito, para selarmos a passagem para uma nova fase, mais conturbada, que requer compreensão, paciência, meditação e dedicação mútua. Seria o símbolo de nossa nova vida de esforços e felicidade.

No dia da prova estava cético. Minha perna ainda doía. Cheguei a pensar em desistir. Procurei não transparecer minha desilusão. Mas vesti meu par de tênis, orei, dei um último beijo em minha esposa e na pequenina, e fui para a avenida Paulista.

Chequei às 16:20h, o clima estava fantástico. Era impossível não se contagiar. Era um João ao meio de 21000 pessoas, Josés, Raimundos, Vanderleis, Camilas, Josefinas, Cristinas, Joanas, Kátias. Uns vestidos de palhaços, outros de mulher maravilha, Dilmas Rousseffs, Pelés, cangaceiros, Robertos Carlos, São Paulinos, Corinthianos, Palmeirenses, Flamenguistas, Cruzeirenses, Santistas, homem de ferro, garçom equilibrando bandeja com copos, corredores com estátuas de Santos nas mãos, alguns descalços, e os idosos... esses emocionam e arrepiam qualquer um. Havia um grupo deles chamado de vovôs Cops, com shorts vermelho e camiseta amarela, com a idade estampada nas costas. Setenta e sete, oitenta e oitenta e três. Que exemplos de vida!!

Quando soou a largada estava pilhado, mas preocupado com a panturrilha esquerda. A vontade era de sair em disparada, como fazia antigamente. Mas tive que me conter. Levei cerca de 15 minutos para cruzar a largada, era muita gente. A multidão de espectadores estava eufórica e nos embalava, meu coração batia a mais de 180 vezes por minuto.

Ao cruzar o primeiro quilômetro, escutei da multidão, muitos com cerveja na mão, o “incentivo”: "vai, só faltam 14 !!". Também mencionaram meu nome, olhei e vi que era um colega médico da Santa Casa. Por um momento não fui um anônimo.

Continuei a descer a Consolação, e já na Avenida Ipiranga, por volta do terceiro quilômetro comecei a escutar o grupo de militares da Aeronáutica. Foi espetacular. Cantavam juntos e em voz alta, sincronizados, e batiam palmas. Todos ao redor passavam a acompanhá-los no ritmo dos gritos e das palmas. Minha empolgação foi tamanha que tentei acompanhá-los no ritmo rápido que corriam, e então senti a perna. Diminuí a velocidade e gelei. Pensei em parar. Peguei o celular, abri e procurei na agenda o telefone de minha mulher. As primeiras lágrimas desprenderam de meus olhos. Mas aquela ainda distante imagem, delas me esperando na avenida Paulista, segurou-me. Guardei o celular e continuei com passadas mais curtas. Precisava afastar de mim aqueles pensamentos de desistir. Olhei para o lado e vi um rapaz que parecia se poupar. Corria na mesma velocidade. Puxei conversa e contou que não havia treinado regularmente, trabalhava 14 horas diárias. Mas corria todo ano, não conseguia imaginar um ano sem a São Silvestre. Fomos correndo e conversando, contou que gostaria de voltar a treinar para correr na Disney e ganhar a medalha do “pateta”. Para conseguir tal desafio são necessários dois dias de prova, no primeiro meia maratona e no dia seguinte os 42.195 metros. É para poucos!. O ritmo mais lento de corrida fez com que a dor desaparecesse e continuamos na mesma passada. Nossa tática era de fazer as contas de maneira diferente. O que faltava era metade da prova, dois quintos, nunca eram quilômetros. No sétimo quilômetro Eduardo passou a andar, despedi-me e continuei a saga.

Após o elevado Costa e Silva, já na avenida Norma Gianotti, a lesão voltou a incomodar. No posto de hidratação, aproveitei para alongar e novamente veio à cabeça a imagem das duas na Paulista. Aquela visão começava a ganhar vida. Agora já havia ultrapassado metade da prova!. Precisava agüentar!. Voltei com mais garra e passei a utilizar mais força nas coxas. Veio então a subida da Avenida Rudge, e não fraquejei, mantive a velocidade, concentrado. No meio dela encontrei o homem de ferro com os pulmões de fora. Gritei " você é ou não é o homem de ferro, vamos!!!". Então ele retomou a confiança e voltou a correr, cambaleante. No final da avenida vi os paramédicos do resgate socorrerem uma senhora que passava mal. Nessas provas de longa distância não são poucos que não conseguem terminar.

Na avenida Rio Branco, o encontro com o centro da cidade foi hilário. Cruzei com o tiozinho vestido de Dilma, segurava um pepino na mão direita e um abacaxi na esquerda. Tinha uma peruca vermelha de cabelos curtos, com penteado parecido com o da futura Presidente, vestia um tailleur vermelho, e usava uma dentadura tipo do Ronaldo “fenômeno”. Estava muito engraçado. O problema é que não conseguia correr, todos queriam tirar fotos. Corria duzentos metros e era parado. Mas não se incomodava, interagia com a população, mandava beijos e acenava o tempo todo.

Faltava apenas um terço da prova. Minha perna parecia suportar o ritmo. A cena do nosso encontro ganhava ainda mais veracidade, ganhei muita confiança. Em novo posto de hidratação, tomei meu último energético a base de açúcar e cafeína. A minha frente vi um idoso correndo ao lado de um mendigo. O pobre rapaz parecia drogado, olhos esbugalhados, repetia incessantemente “ o vovô corre muito, o vovô é foda!!”. Cheguei ao lado dos dois e entrei na conversa. Na verdade era um monólogo, pois o velhinho parecia indiferente ao ébrio entusiasmado, com pés descalços e com as solas protegidas por um amortecedor de sujeira que nasceu após vários dias sem banho. Falei que gostaria de ser igual ao velhinho quando crescesse e o ébrio colega, já esbaforido, respondeu “pô, não chego lá não, não dá mais!!”. Então o velhinho nos olhou, riu timidamente, e disse ter setenta e sete anos. O bêbado pobre coitado parou, sem fôlego e sem rumo.

Ao chegar no teatro municipal avistei a placa de onze quilômetros, minha fantasia estava criando asas. O prédio estava em reforma, mas era possível admirar seus pilares e sua imponência. Pensei em parar para fotografar, mas não podia. Tinha que seguir. Passei ao lado de outro provável septuagenário e vi retirar de um de seus bolsos um saco de amendoins. Pensei, deve ser o energético à moda antiga. Logo em seguida havia uma pequena subida, de uns 50 metros, outra como várias que havia passado. Mas nela senti outra lesão, agora na coxa direita. Parecia ser um início de contratura muscular. No mesmo momento avistei a placa de doze quilômetros. Mas e então, aquele sonho ruiria? Seria o fim da prova e da homenagem. Naquele momento já podia senti-las mais perto. Então peguei a musculatura na região medial da coxa e segurei com força. A dor passou, parecia suportável. Passei o largo São Francisco e rumei à Brigadeiro.

Na avenida mais temida da prova avistei a placa de décimo terceiro quilômetro. Agora fazia a conta mais fácil, faltavam dois para terminar. Peguei o celular e liguei, desta vez era para avisar que eu estava chegando. Falei com a voz trêmula, sentia a da minha mulher se embaralhar do outro lado. Chorei pela segunda vez. Minha mão segurava o músculo com mais força. Cruzei com muita gente andando, mas eu queria terminar correndo, como prometi. Na metade da Brigadeiro encontrei o sósia do Pelé. Parei por alguns segundos. Falei que era santista e recebi um abraço e um parto de mão. Falou “Vamos lá santista, só cumprimento santista!!!”. Ganhei esta força extra e continuei, com o mesmo ritmo. Ao acessar o trecho final, após a rua Ribeirão Preto abri uma faixa que guardei para a surpresa final e corri mais rápido para homenageá-las:




E as encontrei no começo da avenida Paulista. Abracei-as e choramos juntos, minha filha apertava o número 12508 da camisa. Beijei-as várias vezes. Orei a Deus e agradeci aquele momento que estávamos vivendo. Será uma de muitas homenagens que farei para as duas mulheres de minha vida: Alice e Julie.


Seguem fotos de outros personagens...